Lavagem da escadaria - Nota de Repudio - Liberdade Religiosa

Nota de Repúdio – Em defesa da Liberdade Religiosa

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Em Maricá, Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa busca garantia da festividade da lavagem das escadarias da Igreja Matriz

A Câmara Setorial de Cultura Afro Brasileira de Maricá, Artistas e Trabalhadores da Cultura de Maricá/RJ, se manifestam em Nota de Repúdio pelo impedimento da realização da 24ª Edição da Festa Tradicional da Lavagem das Escadarias da Igreja Matriz Nossa Senhora do Amparo pelo Padre Max Celestino Sales de Almeida, Pároco da Igreja Matriz que proibiu e impediu a realização da tradicional lavagem das escadarias da Igreja Matriz.

A Igreja Matriz Nossa Senhora do Amparo é Patrimônio Cultural Material e Imaterial do Povo de Maricá e símbolo arquitetônico da cidade, não podendo ser tratada como propriedade comum  por um indivíduo que por mera liberalidade desacata as leis municipais, em desrespeito à história, memória e às tradições do povo de Maricá.  

A Igreja Matriz, cartão postal de nossa cidade, não pode ser um espaço na memória de nossa gente, como um local público de exercício de intolerância e racismo onde lhe é negado o seu direito de acesso.

Consideramos o desrespeito à Lei municipal promulgada 2512/14, e publicada no JOM Jornal Oficial de Maricá, que garante o exercício do direito desta festividade de congraçamento, um desacato aos poderes públicos e especialmente ao Poder Executivo e Legislativo Municipal. O evento faz parte do calendário religioso e turístico da cidade de Maricá, publicado no site da Prefeitura de Maricá no dia 09 de janeiro de 2023. 

Nós, da Câmara Setorial de Cultura Afro-Brasileira de Maricá/RJ, consideramos a decisão arbitrária e também uma violação dos direitos humanos do povo maricaense em exercer suas práticas de festividades religiosas, considerando ainda perseguição religiosa e injustificável da atividade pacífica em Ato pela Paz, sendo a atitude do padre uma nítida demonstração de intolerância religiosa e racismo, francamente combatida pelo atual presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, assim como pelos seus ministros Direitos Humanos – Sílvio Almeida, Ministra de Igualdade Racial – Anielle Franco e da cultura Ministra da Cultura – Margareth Menezes que em seus recentes discursos de posse declararam não mais seria permitido no Brasil

Ministra de Igualdade Racial – Anielle Franco e a Liberdade Religiosa:

 _”É preciso reconhecer que esse país foi sedimentado sob hierarquias raciais, consequências do colonialismo escravocrata das políticas eugenistas e das narrativas pautadas na desigualdade racial aqui se desenvolveu o racismo brasileiro negando a nossa história e falseando uma memória em prol da farsa da democracia racial. O Racismo merece um direito de resposta eficaz e nós gostaríamos de convidar a todos negros e brancos para que possamos formular e  executar juntos essa proposta.”_

Ministra da Cultura – Margareth Menezes:

…“Acompanhamos os diálogos e vimosos  desmontes perversos das nossas políticas culturais das instituições. Sabemos o tanto que sofreram a Fundação Palmares, o IPHAN, a ANCINE, a Biblioteca Nacional, a FUNARTE, e a CASA RUI BARBOSA e o IBRAM, mas principalmente junto com meus colegas nós ouvimos as pessoas, nessas escutas junto com diversas pessoas.. e percebemos a profundidade do que o que aconteceu nos últimos anos, a criminalização dos trabalhadores e trabalhadoras e a falta de entendimento do significado da força da produção cultural do Brasil. Me emocionei com inúmeros relatos de luta do meio da cultura para o reconhecimento dos seus direitos e a busca incessante de seus espaços e de dignidade”, ouvi e acompanhei os diagnósticos e vi as vias de superação e chego agora às duas últimas palavras que darão o tom de nossa gestão no tratamento com servidores da cultura: RESPEITO E CUIDADO!”

Ministro de Direito Humanos Sílvio Almeida:

“Vou dizer o óbvio que, no entanto, foi negado pra nós nos últimos quatro anos, trabalhadores e trabalhadoras do Brasil: Vocês existem e são valiosos pra nós! Mulheres do Brasil: Vocês existem e são valiosos pra nós! Homens e Mulheres pretas e pretos do brasil: Vocês existem e são valiosos pra nós! Povos indígenas desse país: vocês existem e são valiosos pra nós! Pessoas Lésbicas, Gays e Bissexuais: vocês existem e são valiosos pra nós! Transexuais, travestis, Intersexo e não binárias: vocês existem e são valiosos pra nós! Pessoas em situação de rua: vocês existem e são valiosos pra nós! Pessoas com deficiência, idosas, anistiados e filhos de anistiados, vítimas de violências, da fome e da falta de moradia: vocês existem e são valiosos pra nós!  Pessoas que sofrem com falta de acesso a saúde, companheiras, empregadas domésticas, todos e todas que sofrem com a falta de transporte, TODOS E TODAS QUE TÊM SEUS DIREITOS VIOLADOS: VOCÊS EXISTEM E SÃO VALIOSOS PRA NÓS!”

Cabe lembrar que a Lei 7.716 (Lei do Crime racial) tipifica crimes resultantes de discriminação ou preconceitos de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Cabe lembrar ainda que foi recentemente sancionada pelo senado, no dia 13/01/2023, a lei que equipara a injúria racial ao crime de racismo, sendo considerado a partir desta data como crime inafiançável. 

Também o Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva declarou não ser mais possível aceitar intolerâncias de nenhuma espécie em todo território brasileiro.

O desacato das determinações do Presidente da República, e as determinações das políticas públicas do Ministério de Igualdade Racial e do Ministério de Direitos humanos é uma clara demonstração de intolerância religiosa e desrespeito praticado pelo imperialismo religioso imposto nos últimos 500 anos da história à cultura brasileira e aos povos tradicionais que constituem a nossa nação.

Desta forma nos manifestamos em Nota de Repúdio por considerarmos intolerável a omissão de toda e qualquer autoridade e instituição representativa do povo maricaense e solicita a Casa Legislativa, por seus Vereadores e o Poder Executivo, na pessoa do Prefeito da cidade de Maricá, que tome imediatas providências, cobrando o cumprimento da Lei Municipal que garante a festividade da lavagem das escadarias, com a devida reparação social de danos e a marcação de uma nova data para a festividade pacífica do “PEDIDO PELA PAZ NO MUNDO”!

E dentro deste espaço e tempo, procuramos lembrar as autoridades do Município de Maricá, que se faz necessária a criação de espaços naturais e urbanos para atendimento das praticas de religiões de matriz africana que estão sitiadas somente em seus espaços privados, por falta de demarcação legal de seus direitos e uso dos espaços públicos.

Cientes da nossa responsabilidade em representar todos àqueles e aquelas que carregam em si as heranças culturais, religiosas e sociais do continente africano, em um ano que procede seis anos ininterruptos de apagamento, silenciamento e retrocesso de direitos, não só da comunidade afro-brasileira (que se expressa na cor, mas também nas práticas), mas incluindo comunidades indígenas, LGBTQIA+, mulheres e outros grupos anônimos e vulneráveis, principais vítimas das políticas de genocídio e empobrecimento da nossa sociedade  brasileira, esta Câmara opta por participar do espaço de discussão e luta para garantir direitos aos sujeitos praticantes de religiões de origem preta e africana, práticas outrora proibidas e hoje, muitas vezes ainda proibidas e sempre perseguidas, seja por meio de palavras, pedradas, insultos, expulsões e mortes. Mas seguiremos resistindo, pois nossas cabeças só se abaixarão para o Divino. 

Primeiro levaram os negros 

Mas não me importei com isso 

Eu não era negro 

Em seguida levaram alguns operários 

Mas não me importei com isso 

Eu também não era operário 

Depois prenderam os miseráveis 

Mas não me importei com isso 

Porque eu não sou miserável 

Depois agarraram uns desempregados 

Mas como tenho meu emprego 

Também não me importei 

Agora estão me levando 

Mas já é tarde. 

Como eu não me importei com ninguém 

Ninguém se importa comigo.

                             Bertolt Brecht

 

Conselho de Cultura de Maricá

Câmara Setorial de Cultura Afro-Brasileira

Conselheiro Júlio Fernandes

 

Foto Destaque: Arquivo PMM/Marcos Fabricio

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